ECONOMIA DIGITAL

Celeiros de startups

Piracicaba (SP) e Londrina (PR) são algumas das cidades universitárias do interior do Brasil que estão se tornando centros de inovação agrícola  

Nely Caixeta e Armando Mendes
Publicado em 22 de janeiro de 2020, 15:50:45

Prédio da Esalq, em Piracicaba: 70 startups voltadas para o agronegócio          Foto: Nely Caixeta

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Esta reportagem é composta de cinco partes. Leia os demais textos nos links abaixo:

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As agtechs brasileiras surgem concentradas em um punhado de cidades e regiões que combinam forte economia de base agrícola com instituições de ensino e pesquisa atuantes. Essas escolas são os alicerces responsáveis por preparar engenheiros, cientistas e pesquisadores acadêmicos e corporativos que formam a linha de frente dos ecossistemas de inovação tecnológica.

O melhor exemplo de polo agtech no país é Piracicaba, em São Paulo. Com população de cerca de 400 mil habitantes, a cidade tem 41 empresas listadas no Radar Agtech Brasil 2019, um levantamento lançado em 2019 pela Embrapa, SP Ventures – gestora de investimentos em venture capital que dedica grande parte de seus recursos a startups agro –, e Homo Ludens Research and Consulting.

Piracicaba fica atrás apenas de São Paulo, capital, entre as cidades brasileiras com maior número de pequenas e médias empresas de tecnologia para o agronegócio. Seu ecossistema de inovação – batizado de Vale do Piracicaba (ou Agtech Valley, em inglês), na onda dos clusters que buscam emular o Vale do Silício – foi construído sobre a ampla base de conhecimento e produção lá instalada.

 

AS AGTECHS SURGEM EM REGIÕES DE ECONOMIA

AGRÍCOLA E COM ESCOLAS E CENTROS

 DE PESQUISA ATUANTES

 

Do lado da produção, a região de Piracicaba é um dos polos da forte economia sucroalcooleira paulista, sede de fazendas, usinas e indústrias da cadeia produtiva da cana. Do lado da ciência, hospeda a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) – mantenedora da incubadora tecnológica EsalqTec, instalada numa das fazendas urbanas que formam o campus da escola – e instituições de pesquisa responsáveis por muitas das inovações do setor, como o Cena (Centro de Energia Nuclear na Agricultura) e o CTC (Centro de Tecnologia Canavieira).

A EsalqTec abriga mais de 70 startups voltadas para o agronegócio. Nos laboratórios e campos experimentais da Esalq-USP, estudantes de pós-graduação e criadores de startups têm a chance de trabalhar ao lado de professores e pesquisadores experientes. Para Sérgio Marcus Barbosa, gerente executivo da EsalqTec, alimentar este mecanismo gerador de conhecimento e recursos humanos é essencial para a saúde de todo o ambiente de inovação agro.

Barbosa, da EsalqTec: produzir conhecimento é o que alimenta a inovação  Foto Marcela Matavelli

“No Brasil, produzimos pesquisa própria para a agricultura; é nosso diferencial”, diz Barbosa. “O que nós temos de pensar agora – no presente, não no futuro – é em como digitalizar este processo, desde a geração do conhecimento até sua utilização pelo produtor rural, na distribuição e no consumo.”

De dois anos para cá, o ambiente de Piracicaba ganhou reforço importante com a criação de dois hubs digitais: Pulse e AgTech Garage. O primeiro é a aceleradora de startups da Raízen, alojada num prédio vizinho ao Parque Tecnológico de Piracicaba. No segundo semestre de 2019, o hub abrigava 25 startups residentes, e 15 delas já testavam projetos-pilotos com a Raízen.

Reunião no Pulse, o hub de inovação da Raízen: 25 startups residentes     Divulgação

Ambientes assim surgem também em outras partes do país. Em Londrina (PR), desenvolve-se um vibrante polo de inovações digitais para o agro. São incubadoras, coworkings e até um centro de inteligência artificial, surgidos no embalo da pioneira Go SRP, aceleradora nascida a partir dos hackathons Smart Agro promovidos pela Sociedade Rural do Paraná – desafios entre times de programadores que propõem soluções tecnológicas para o campo.

O criador dos hackathons e do hub, o engenheiro agrônomo George Hiraiwa – formado na Esalq- -USP e ex-secretário de Agricultura do Paraná – destaca o número de startups surgidas ali que partem depois para programas de aceleração fora do estado. “Londrina hoje se posiciona como um berçário de startups agro”, diz ele.

Na direção do Centro-Oeste, o primeiro hub de inovação agtech de Goiás, batizado de Conexa, foi inaugurado há meses na capital, Goiânia. O Conexa é iniciativa da Siagri, empresa de softwares de gestão agrícola, e começou com quatro startups incubadas.

Conexa, recém inaugurado em Goiânia: quatro startups incubadas     Divulgação

Todos esses polos, fincados nas principais regiões agrícolas do país, parecem distantes da vocação da cidade de São Paulo, o maior centro urbano e financeiro da América Latina. Mas é só aparência. São Paulo é hoje o maior criadouro de startups agro do Brasil: abriga 262 empresas identificadas no Radar AgTech Brasil 2019, bem à frente das 41 agtechs de Piracicaba, a segunda no ranking.

A alguns passos da avenida Paulista, pode-se ter um gostinho da São Paulo que combina a cultura digital com o campo. Uma torre moderna espetada num lote entre a avenida Angélica e a rua da Consolação abriga o inovabra habitat, um centro de inovação mantido pelo banco Bradesco.

O Inovabra habitat, no coração de São Paulo: soluções para o campo        Foto: Egberto Nogueira/ Divulgação

Ambiente mais urbano-século-21 não poderia haver. Num dos nove andares, o visitante se depara com um balcão de bar no meio do salão sem divisórias. O mobiliário colorido segue o padrão Google, modelo para empresas de tecnologia no mundo todo. A qualquer hora do dia, é constante o entra-e-sai de jovens vestidos casualmente, carregando nas mochilas e nos notebooks os projetos com que sonham impactar o mundo

Lá estão sendo gestadas soluções para o campo, por startups residentes cujos nomes – Agrosmart, AgrusData, AgriSolus – definem de saída seu propósito. Esses empreendedores vindos de várias partes do Brasil encontram-se com programadores, investidores de venture capital e executivos de grandes corporações, todos eles de olho no potencial de inovação do lugar.

Este texto foi publicado entre as páginas 16 e 19 do número 39 da Revista PIB, de dez/2010 e jan/2020, como parte da matéria de capa Revolução Verde 4.0.

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